Texto de Acção de Graças Pelo Ministério do Pároco: Pe. Francisco Melo.

Texto de Acção de Graças Pelo Ministério do Pároco

da Gafanha da Nazaré, Gafanha da Encarnação e Gafanha do Carmo:

Pe. Francisco José Rodrigues de Melo, 01 Agosto de 2015.

O texto abaixo torna-se difícil pela proximidade de funções e pela amizade partilhada ao longo de anos, mas não tentar escrever sobre a realidade presente significava o silenciar da Vida. Nem tudo pode ser escrito, mas obrigatoriamente alguma coisa tem que o ser. Fica a partilha desta prática enquanto paradigma humano.

Se olharmos simplesmente para o modo como habitualmente são visualizadas as responsabilidades de um pároco, a primeira coisa que observamos é que se trata de um “ofício” que é muito exigente e diverso. A segunda é que é difícil encontrar pessoas-modelo aptas para o cargo. O Povo sentencia: «Nem Deus que foi Deus agradou a todos».

O que significa que devemos, talvez, nos contentar com o que está ao alcance da nossa disponibilidade, em vez de procurar quem corresponda ao que desejaríamos. “Fazer crescer os outros à sua volta. Não fazer e não ser “sombra” para ninguém”. Desapego radical do Poder. Podemos até, inadvertidamente, nos consolarmos ao dizer: «Deus nunca nos deixará desprovidos», mas isto pode ser um falso consolo, porque muitos paroquianos (cristãos de toda a tipologia: praticantes, adormecidos, ocasionais, anuais, festivos…) poderiam ser confrontados com uma experiência prolongada da providência divina, na ausência da providência do Pároco, a quem é confiada determinada Comunidade Humana e Religiosa.

Contrariamente, à crença católica oficial, a ordenação não transforma um homem. Quem se deixa ordenar padre: recebe o Dom de «servir» como «padre» a Igreja; e só nessa medida livre, tem acesso à Autoridade e à Graça, do Sacramento da Ordem. Mas a concretização dessas, na história e na geografia humana, dependem das qualidades humanas que estão presentes naquele que é ordenado.

Que releitura é possível – a mim, que sou suspeito, mas quero imparcialidade: sabendo que não há subjectividade «pura» nem objectividade «pura» – estar presente nas qualidades humanas e sobre o modo como a Graça se pode manifestar nas qualidades humanas, no exercício do Ministério do Pároco: Pe. Francisco Melo, com quem compartilhei, de modo próximo, ao longo destes anos. [Sem inocência, comungo como «reflexo» neste modo de ser/estar, e desejaria projectar, – em continuidade e sem ruptura – o meu exercício do Ministério de Padre: como Pároco, ao fim de 18 anos de ordenação… Resumidamente: todo este processo de mudança pastoral foi metodicamente mal conduzido – os termos “metodicamente” e “mal” (moral e técnico) opino que bem empregues, quanto a “conduzido”, não encontro outra expressão – por quem de direito no governo da Diocese de Aveiro, na comunhão corresponsável. Quero dar graças por tudo o que convivi e aprendi, porque creio: “Qualquer que fosse a resposta que déssemos à questão [este processo pastoral e humano, pessoal e comunitário] a solução continuaria a ser, de qualquer modo, provisória e perder-se-ia sempre na incompreensibilidade de Deus e da sua liberdade” (Karl Rahner)].

Faço-o assim, a partir de leituras e da vida partilhada no Ministério, resumidamente, um sublinhado de algumas dimensões/qualidades que considero fundamentais; todos damos graças pelas mesmas, desejando que nos continuem a inspirar no futuro.

1. É necessário reconhecer um homem-padre com garra; com alma; um homem que tenha confiança em si mesmo e transmita confiança à sua volta; um homem que tenha um estilo de vida concreto, seja forte também no ponto de vista mental. Que não se deixa monopolizar por “interesses” ou “grupinhos”. É preciso reconhecer um homem-padre que os jovens e os homens admirem e que as mulheres respeitem. É preciso reconhecer um homem-padre que seja capaz de atrair os jovens, as crianças, os idosos, ao seu redor, encorajando-os a explorar e desenvolver a Vocação Baptismal ao serviço da Vida, na Comunidade para todos, sem discriminação, na força e no talento de cada Pessoa. Um homem-padre em que os Leigos que estão dentro da Igreja e as todas as pessoas que estão fora da Igreja vejam como alguém coerente.

2. A coerência testemunhada e vivida é de suma importância. O padre-homem é uma pessoa que, com prudência, diz no que acredita e o coloca em prática. É necessário perguntar: Deve ser um cristão que se associa somente com aqueles que compartilham suas simpatias e antipatias, ou é um cristão que se compromete com firmeza com pessoas que são diferentes dele? É um cristão que segue a corrente ou alguém que vai na contra corrente? É um cristão do qual se pode estar seguro de que agirá, apesar dos seus erros e pecados, com a coerência de quem se sabe em conversão?

Os princípios são de suma importância. O cristão padre é uma pessoa que insistirá para que os processos sejam transparentes e justos e que a Justiça seja a mais correta, para o Bem de todos, pela Misericórdia de Deus. Perguntar confiando no Deus Crucificado e Ressuscitado: É um cristão, entre iguais em Dignidade, que faz o que é justo, verdadeiro e bom, diante de Deus e dos irmãos, ou o tipo de pessoa que, quando o jogo fica difícil, faz o que pode para escapar dele?

3. Um padre não é ordenado padre para si mesmo, mas para Deus e para a sua Igreja, nas paróquias que for chamado a servir. A sua Autoridade e a sua Graça/Dom fundamentam-se no Gesto do «Lava-Pés» de Jesus Cristo. Essa é a sua responsabilidade livre: servir os irmãos, no meio do povo de Deus que é confiado à sua guarda. Por essa ordem de razões: o serviço da inclusividade é de suma importância para o modo de construir a Comunidade. Como padre e pastor, deve trabalhar para edificar uma Comunidade na qual as pessoas mais diversas encontram o espaço e sejam acolhidas. Deve demonstrar ser alguém com uma apurada e treinada, capacidade de escuta, de tal forma que sente, profundamente, o “pulsar” da vida e suas necessidades. Não deve ser o tipo de pessoa que age em função das suas próprias ideias, dos seus preconceitos, das suas feridas e mágoas. Não deve ser o tipo de pessoa que vê as coisas de forma parcial, apenas no preto e branco.

4. A Oração é de suma importância. Naturalmente, um padre está intimamente ligado à celebração principal da santa Eucaristia, dos “restantes” sacramentos, e da recitação da oração “oficial” pedida pela Igreja. Mas o que é ainda mais importante é que o escutar a Deus o faça perguntar: “O que queres que seja feito?”; “Meu Deus, o que tu farias nestas circunstâncias?”; “Diante do que escuto – pastor com “cheiro a ovelhas” – meu Deus que queres que eu diga e faça?”; “Por favor, Deus, silencia os meus falatórios, e ajuda-nos a perceber a Tua acção, na vida do dia-a-dia, de todas as pessoas!

5. A humildade é de suma importância. Com frequência, as pessoas interpretam mal a humildade. “A humildade é a fortaleza dos que se sabem fracos [!?]”. A verdadeira humildade é fundamentalmente objectividade: Quem sou eu diante de Deus? Quem sou eu em relação com os outros, homens, mulheres e crianças? Quais são os dons que eu tenho, e quais são os meus limites? Onde e como devo inclinar-me para os outros? Onde e como devo seguir os conselhos dos outros? A humildade é robusta. A humildade é o primeiro Evangelho como Ternura!

6. O amor da beleza de quem sabe presidir/coordenar é, também, de suma importância. A minha roupa “normal” pode ser uma camisa ao “xadrez”, calças de “ganga” de cor escura e calçado preto ou “desportivos” (bem lustrados). Um “look”, por vezes, sem excessos, diríamos, “informal”. Mas das coisas grandes às coisas pequenas, dos aspectos de uma cerimónia elevada às questões banais, um adequado sentido de discernimento “institucional” é importante. Saber estar. Saber presidir. Saber representar e representar-se. As pessoas têm necessidade de serem edificadas em todos os campos: revelar o cuidado da «imagem/linguagem», na apresentação e representação, sem nunca ser asfixiante; desde a liturgia diária à liturgia mais solene; da reunião no pequeno grupo de trabalho, às assembleias paroquiais, aos compromissos com a Sociedade Civil, etc. É muito importante que o padre seja uma pessoa que compreende a beleza da Instituição Igreja, da Sua Missão, que ama e serve a todos, que comunica a Justiça e Paz de Deus, desde as coisas mais simples e humildes até às coisas solenes.

Tudo isto aprendi, de sobremaneira, com o Pároco: Francisco Melo.

7. O exercício intelectual é de suma importância. “Sem peneiras, arrogância ou cheiro a carreirismo”. Faz do estudo dos problemas, pastorais e humanos, uma procura atenta na defesa da Fé. Vivemos num mundo complexo e multiforme que no «encontro» requer uma compreensão profunda e um pensamento que cative. Com muita frequência, actualmente, os padres não podem falar “sentenciosamente” sobre questões que não compreendem e nas quais os Leigos seriam mais competentes; ou reproduzem opiniões vindas da “burocracia eclesiástica” que não humanizam a sua acção como pastores e servidores.

O padre, hoje, deve ser uma pessoa que demonstra capacidade de ver além de todas as “obsessões / neuroses” do Mundo e da Igreja (infelizmente também as tem de modo desfocado…); uma pessoa que saiba “ler a Vida”, pois “a vida também se lê” (com a gramática do Evangelho e da Tradição) e ajude a distinguir a solução para as crises; seja capaz de valorizar e elaborar, de maneira crítica, objectivos-planos-orçamentos-respostas, etc, para realizar as melhorias e conservar a herança do passado, na linguagem do presente. O padre, com o contributo de Todos, deve ter uma mente forte e rigorosa, com a capacidade de colocar em prática o que tem na Cabeça, guiado pelo Coração, sem medo de sujar as Mãos e os Pés.

Tudo isto aprendi, acima de tudo, com o Pároco: Francisco Melo.

8. A capacidade de aplicação prática é de importância crucial. O “ofício” de padre é maior do que as suas capacidades humanas, não pode ficar/estar sozinho, o que significa que um padre deve ser ajudado nas tarefas e desafios. Esta ajuda vem, em primeiro, lugar dos colaboradores mais próximos, dos agentes de pastoral (conselheiros, catequistas, dirigentes de movimentos, pessoas cuja afinidade e competência possa ser o «filtro crítico» e a «reserva moral», etc.). Na maioria dos casos ou problemas, dentro e fora da Igreja, há energias demasiado desgastantes. “Não se podem resolver problemas do presente com soluções do passado”. A administração da Igreja deve ser eclesial (isto é, humanizadora e evangélica) no seu funcionamento, e isto deve ir de alto a baixo. O padre pastor aprende, cada dia, com humildade e lealdade, na capacidade de colaboração, de “trabalhar com” mais do que “trabalhar acima de”.

Tudo isto aprendi, na teoria e na prática, com o Pároco: Francisco Melo.

9. Finalmente. Vou tentar concluir.

Decidir o que não fazer é de crucial importância. Existiu um tipo de padre que pensava que podia fazer tudo e administrar tudo e, tantas vezes, pelo contrário, correu o risco de acabar por fazer muito pouco. Há um tipo de padre que trabalha incansavelmente e que realiza pouco, é ineficiente e ineficaz, porque não sabe distinguir entre o que pode fazer (bem ou menos bem) e o que não pode fazer (menos bem ou mal). Existe um tipo de padre que não faz nenhum exercício físico, nenhuma diversão regular, nenhuma atividade cultural, nenhuma leitura edificante: um tipo de padre que é somente “um aborrecido burro de carga”. Esse tipo de cristão e padre não cultiva a «Alegria do Evangelho»; não serve o «Rosto da Misericórdia de Deus»; não desperta nos jovens «o gosto» para o ministério sagrado; não encoraja ou não desenvolve os dons dos Irmãos na Fé e na Esperança.

Tudo isto aprendi a distinguir, decidindo a viver ou não, com o Pároco: Francisco Melo.

Sob a Bênção de N.S. do Carmo, Encarnação e Nazaré,

Com Gratidão pela Pessoa que é,

em consideração à Vida e ao Trabalho em Comum,

Com Amizade e Fé, nesta hora de partida e passagem de Testemunho.

Pe. Pedro José, nomeado Pároco da Gafanha do Carmo e da Gafanha da Encarnação, e nomeado Vigário Paroquial da Gafanha da Nazaré, 01 de Agosto de 2015.

FONTES consultadas, pela influência e como leitura da vida presente: [1.] Edição On-line: http://www.vatican.va/holy_father/francesco/apost_exhortations/documents/papa-francesco_esortazione-ap_20131124_evangelii-gaudium_po.html, acesso: 03-12-2013. Edição em Papel: Paulus Editora, Lisboa, 2013, pp.207; [2.] MISSÃO JUBILAR – 75 anos da restauração da Diocese de Aveiro 1938-2013, Diocese de Aveiro, 2012, pp.215 [Especialmente: Pe. Francisco J. R. Melo, Coordenador da Missão Jubilar – Vigário Episcopal para a Pastoral Geral, “A Igreja de Aveiro Em Missão”, in Síntese, nº223, Nov/Dez – 2013, pp.27-32)]; [3.] Cfr. BACQ, Philippe e THEOBALD, Christoph (Dir), Uma nova oportunidade para o Evangelho: para uma pastoral de gestação, Paulinas Editora, Prior Velho, 2013, pp.262; [4.] JOSÉ, Pedro, É Mesmo Uma Boa Nova: Escritos, Estudos e Vivências de um Padre no Brasil, Tempo Novo Editora, Aveiro, 2014, pp. 319; [5.] Cfr. LAMET, Pedro Miguel, Pedro Arrupe, Testemunha Do Século XX, Profeta Para o Século XXI, Edições Tenacitas, 32010, Coimbra, pp.564; [6.] Cfr. MAGALHÃES, Vasco Pinto, SJ, Entregar-se, Acolher e Comungar, Edições Tenacitas, Coimbra, 2013, pp.220; [7.] Cfr. MARTIN, James, S.J., Jesus: Um Encontro Passo a Passo, Paulinas Editora, Prior Velho, 2015, pp.526; [8.] McGAVIN, Paul A., http://www.ihu.unisinos.br/noticias/544901-cacadores-de-talentos-para-os-futuros-bispos, acesso: 24-07-2015; [9.] Cfr. RAVASI, Gianfranco, Breve História da Alma, D. Quixote, Alfragide, 2011, pp.320; [10.] RAHNER, Karl, Porque razão nos deixa Deus sofrer?, Editorial Franciscana, Braga, 2011, pp. 76. [11.] Cfr. RIBEIRINHA, José, História da Festa Nossa Senhora do Amparo, Editora Tuella y Rabaçal, Mirandela, 2010, pp. 66.
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2 respostas a Texto de Acção de Graças Pelo Ministério do Pároco: Pe. Francisco Melo.

  1. Rosa Maria Teiga diz:

    Obrigado Padre Pedro pelo belíssimo texto…fez-me recordar o muito o que aprendi ( e continuo a aprender ) com o padre Francisco Melo a ser uma melhor cristã, a viver melhor a minha consagração batismal…Dou Graças a Deus!…

  2. Pingback: «CARTA ABERTA»: “O sinal da Assunção de Maria” (15/16-08-2015)”. | Lazer & Labor

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